Saturday, June 16, 2007

sobre a dança tradicional

A Dança Tradicional, na minha experiência, é sobre dançar com o outro e para o outro. E para fazer isso sinto que preciso de trabalhar, antes de qualquer outra coisa, sobre o estado de completa disponibilidade (tão inteira quanto posso entender o que é estar disponível a cada momento). Porque estar com o outro para um propósito comum, que implica a solicitação dos corpos físicos, não permite uma mera compreensão deste outro. É preciso criar um espaço para o seu acolhimento.
Dançar implica o reconhecimento do momento presente. A dança que se constrói e ao mesmo tempo se alimenta da relação, como é o caso das danças tradicionais, não permite que eu me situe em mim própria no conforto da realidade que construo para lidar com o quotidiano. Se insistir aí, então a dança é mecânica, uma volta é apenas uma rotação ou um salto é só um impulso em que ponho ao mesmo tempo os dois pés fora do chão.
Quando danço as coisas nunca são o que são. Porque quando o meu corpo toca outro, ou age considerando a distância ou proximidade do outro – o que entendo também como uma forma de tocar – torna-se evidente que o mundo não é previsível. Ao contrário abre suspensões que não se organizam em função do tempo ou do espaço absolutos. Para quem dança danças tradicionais esta sensação é inscrita (ou será recuperada?) no corpo, de forma muito mais indelével do que saber o caminho para casa ou reconhecer um rosto familiar. É algo de enraizador da pessoa em si própria. Algo a que inconscientemente se recorre para fazer escolhas, e fazem-se milhares delas num único dia.
A dança tradicional é então, para mim, um instrumento de afinação do único recurso que disponho para saber quem sou: O meu corpo.

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